Wednesday, July 19, 2006

A TRAGÉDIA, as FÉRIAS e o ANIVERSÁRIO













"Foi horrível de se ver e estragou-me o dia de praia (e o resto do dito), de tal modo que no momento em que vos estou a escrever ainda tenho gravada na mente a imagem da jovem que morreu afogada à minha frente -e de outros banhistas, "na flor da idade", na expressão de uma senhora balzaquiana, de face severa e fato-de-banho verde decorado profusamente com minúsculos submarinos amarelos. Pálidos estavam os rostos de quem testemunhou a tragédia e que não queria acreditar que a imprevidência paga-se por vezes com a vida. Apesar dos avisos de quem conhece a zona e dos apitos do banheiro, a jovem teimou e acabou por ser levada pela corrente "enquanto o diabo esfregou um olho" nas palavras de um homem de calções vermelhos e de tronco completamente coberto de pelos que até parecia ter uma t-shirt preta vestida."
Esta podia ser a estória apoiada pela imagem em que ilusóriamente se poderia pretender mostrar uma cabeça de cabelos loiros meia submersa na água. Felizmente que desta vez não morreu ninguém, a suposta cabeça não passa de uma pedra coberta com algumas algas e a minha mente -sempre na procura do insólito, engendrou o drama... que não chegou a ser.
Sem dramas, bem pelo contrário, com satisfação para ambas as partes (suponho... ), anuncio-vos que vou fazer umas férias e que reaparecerei lá para meados de Agosto. É um prémio que dou a mim próprio pelo primeiro aniversário (que passa hoje), do "Papel de Fantasia". Eu viajo; e vocês ficam livres de mim durante um tempo.
Algures em Palma de Maiorca, 2006. Texto e foto de: Alberto Oliveira.

Saturday, July 15, 2006

CENAS do TEMPO ESTIVAL
















Sociólogo que se preze sabe que investigar a maneira de ser do cidadão português, passa inevitavelmente pelo trabalho de campo... na praia. De facto, é nesse meio-ambiente de relaxamento ou, se se quiser, de descompressão mental que a lusa gente abre as defesas e revela em plenitude hábitos e costumes que de outro modo dificilmente se denunciariam.
Num destes dias de calor intenso, preparava-se o escriba para avaliar da temperatura da água e dar o mergulho da praxe, quando se lhe depara a cena que a imagem documenta e da qual transcrevo as frases escutadas em directo. Em primeiro plano, Dona Isaura repreende o filho, enquanto revolve com os pés a areia molhada «Estou farta de te dizer que não deves brincar com a prótese dentária do teu avô! Já pensaste como é que ele vai mastigar os bifinhos de cebolada que trouxemos? !». Mais à frente, com as ondas a lamber-lhe os pés, um grupo de crianças de um ATL da Damaia, espalha pelas salsas ondas, o líquido das necessidades básicas matinais; à hora certa e em colectivo. A monitora, quando me vê de máquina fotográfica em punho, grita esbaforida para a Dona Isaura «Ó minha senhora! Olhe esse homem aí ao pé de si a tirar fotografias às minhas crianças!É um tarado!... DEPRAVADO!!!». A Dona Isaura nem para mim olhou, que as suas preocupações eram outras. Eu, óbviamente, retirei-me do local, assobiando "A Portuguesa".
Costa da Caparica, 2006. Texto e foto de: Alberto Oliveira.

Wednesday, July 12, 2006

UM PÉ à FRENTE e OUTRO NO SÍTIO do COSTUME














De peito feito e sedento de lances gloriosos, avançou intrépido para as ondas que o desafiavam mordazes; alterosas e bramindo a escassos trinta metros de distância, para depois virem morrer dóceis a seus pés. E quando exangues as sopunha, eis que astutas e velozes se retiravam diante dos olhos trocados por tão insólito estratagema. E iam e vinham; chegavam e partiam, sem parança. E ele avançava pela água chã adentro, pé-ante-pé mas decidido, ao encontro de uma delas -se possível da maior e trespassá-la, que esse era o desígnio maior e para o qual tão duramente se havia adestrado. Na areia seca e quente tinham ficando os outros banhistas que acreditavam que ele era capaz de chegar ao fim de tal empresa; aplaudiam-no e incentivavam-no quase sem descanso. Até que -num golpe desafortunado do destino, uma das ondas o fez perder o equilíbrio. Isso aconteceu precisamente no momento em que já se preparava para vencer aquela que era o seu objectivo.
Trouxeram-no para areia firme, exausto, desconsolado e não convencido da derrota. O porta-voz dos banhistas, garantiu-lhe que se tinha portado muito bem e que no início, nem acreditavam que chegasse tão longe. Depois um outro, com aspecto de presidente-de-qualquer-coisa, deu-lhe um abraço e entregou-lhe um envelope, acrescentando emocionado «Você bateu-se bem! Tão bem, que nem percebeu que no ardor da contenda com o mar, ficou sem os calções. Para uma refeição quente e para comprar qualquer coisa para vestir, tem aí dinheiro; e isento de quaisquer deduções ao fisco.»
Costa da Caparica, 2006. Texto e foto de: Alberto Oliveira.

Sunday, July 09, 2006

"PINTAR o OITO"

















Dar repouso (ou paz... ), às cores, às formas e aos discursos de que são feitas as personagens que por aqui vou deixando; porque hoje é domingo. Fazer a revisão da matéria lendo, pela manhã e na esplanada do costume e não ir à praia; porque hoje é domingo. Almoçar com a família, sem olhar para o relógio de dez em dez minutos, conversando sobre coisas agradáveis (que ainda as há... ), embora saibamos todos que, preferencialmente, cultivamos a alegria do cemitério quando, sem grande dificuldade, poderíamos optar por um sorriso cúmplice, pelo enlevo que transparece do olhar daquele jovem casal, para o filho que dá os primeiros passos no relvado, ali para os lados de Belém, ou emocionarmo-nos -pela positiva, porque entre duas cidades, sob um céu pleno de azul, há um rio que corre; ainda... e porque hoje é domingo.
Amanhã, segunda-feira, que se acautelem os ministros, os autarcas, os partidos, os sindicatos, os investidores, os proprietários, os profisionais liberais, os trabalhadores por conta de outrém, os pequenos comerciantes, os treinadores de futebol, os vizinhos e os seus animais domésticos e os amigos e conhecidos, reais ou virtuais. Será tempo de "pintar o oito"; nas calmas. Que não está tempo de correr a foguetes...
Almada, 2006. Texto e foto de : Alberto Oliveira.

Thursday, July 06, 2006

DA PEDAGOGIA do FADO



















Sem prazer e sem desgosto
sem lágrimas pelas partidas
sem sorrisos pelas chegadas
preso nas paixões de agosto
e de outras só pressentidas
pois eram tantas as amadas
que em cada porto habitava
não lhe chegavam os braços
nem as promessas tão pouco
qualquer mulher que beijava
não se lembrava dos traços
sentia-se confuso e louco.

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A voz do cego extinguiu-se antes dos últimos acordes da decrépita guitarra se diluirem na ampla rua pedonal. Arsénio, que sabia distinguir a pureza melódica e letrista do fado essencial, do fado-canção, achou que devia premiar a coragem artística do pedinte. Da carteira, tirou uma nota de dez euros e depositou-a numa tampa de latão que o velho tinha à sua frente no chão. À audição apurada do cego, não escapou o acto. Desconfiado de início (porque eram tantos os que gozavam com a fatalidade alheia), os seus dedos tactearam lentamente a cédula do Banco de Portugal, a cara cavada de rugas abriu-se naquilo que poderia ser um sorriso e exclamou «Porra!!». Arsénio satisfeito, afastou-se com um brilhozinho nos olhos. Estava decidido; iria alistar-se na marinha.
Lisboa, 2006. Poema, texto e foto de: Alberto Oliveira.

Monday, July 03, 2006

PROJECTO em CARTEIRA


























Não é que me falte material para os relatos do costume. Simplesmente cada um deles -por mais modesto que seja, carece de algum ordenamento de ideias e tempo para... as ordenar. Deste modo, aqui fica uma imagem (sem a qualidade de outras editadas pelo motivo acima explicitado) de um projecto daqueles que nunca verá a luz do dia; porque a noite se aproxima a passos largos e porque a exequibilidade do mesmo apenas seria possível apoiado por investidores com a conta bancária a zeros ou com a cabeça à razão de juros. Pior ainda; são visíveis ?! as lacunas de que enferma o projecto e as anotações pessoais que nele inscrevi. O que é éticamente reprovável.
Para ler as legendas na imagem, clicar na mesma; suavemente...
Almada 2006. Técnica mista sobre tela (inacabada), texto e foto de: Alberto Oliveira.