DA PEDAGOGIA do FADO
Sem prazer e sem desgosto
sem lágrimas pelas partidas
sem sorrisos pelas chegadas
preso nas paixões de agosto
e de outras só pressentidas
pois eram tantas as amadas
que em cada porto habitava
não lhe chegavam os braços
nem as promessas tão pouco
qualquer mulher que beijava
não se lembrava dos traços
sentia-se confuso e louco.
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A voz do cego extinguiu-se antes dos últimos acordes da decrépita guitarra se diluirem na ampla rua pedonal. Arsénio, que sabia distinguir a pureza melódica e letrista do fado essencial, do fado-canção, achou que devia premiar a coragem artística do pedinte. Da carteira, tirou uma nota de dez euros e depositou-a numa tampa de latão que o velho tinha à sua frente no chão. À audição apurada do cego, não escapou o acto. Desconfiado de início (porque eram tantos os que gozavam com a fatalidade alheia), os seus dedos tactearam lentamente a cédula do Banco de Portugal, a cara cavada de rugas abriu-se naquilo que poderia ser um sorriso e exclamou «Porra!!». Arsénio satisfeito, afastou-se com um brilhozinho nos olhos. Estava decidido; iria alistar-se na marinha.
Lisboa, 2006. Poema, texto e foto de: Alberto Oliveira.
34 Comments:
como pode, ser possível, afinal sempre é verdade... quantidade não é qualidade!
«não lhe chegavam os braços»
'São dois braços/são dois braços/servem para dar um abraço/assim como quatro braços são para dar doir abraços/(...)/vão ser tantos os abraços que não vão chegar os braços'
- Sérgio Godinho
Eh pá! Lá por nos terem roubado no jogo da França não vale a pena tanto sacrifício! Aliás, VIVA PORTUGAL!
Abraço
Olá meu amigo. Não sei bem porquê, mas a verdade é esta: você adivinha-me em cada letra, em cada frase, em cada texto... o amor da minha vida é da marinha. Que delícia de imagem, Tejo e tudo. Que bela imagem, outra, podemos imaginar a partir do seu texto, sempre sábio, perspicaz. Um beijo para si. Até breve. Azul.
Olha, calhando, eu também vou!... :)
os versos que o cego entoa
são de uma finura tamanha
que nem o texto me soa
tal cada verso se entranha
Mais um fim que nos faz sorrir pelo inesperado! Mais uma excelente história!
(e nesse barquinho ando todos os dias...)
sim, às vezes faz-se luz em coisas qeu não têm nada a ver
quem é que tem um post lindo no amar palavras quem é?????
beijo.
bom dia.
(obrigada pelos www.)
Final sorridente e caloroso :)
...Portugal país de marinheiros... cegos?
...
"qualquer mulher que beijava
não se lembrava dos traços"
olha!
e eu que sempre gostei de homens de farda... dá uma certa altivez e combina sempre com qualquer vestidinho que eu use!
lolol
:)
beijinhos!
bom dia!
Não consigo fazer comentários hoje. Deixo-te um beijo e, mais uma vez, gostei imenos do texto.
Gostei muito do texto! :)
Beijinho.
Carissimo,
Raptei o Arsénio. Não para pedir resgate, que sei que a última nota que tinha ficou o cego com ela.
Raptei-o quase sem crer. Espero que não te importes.
(A mega-produção existe na cabeça, é a história de um anão que queria participar na marcha de Alfama, mas a quem não deixam cumprir o sonho. Está adiada, à espera de qualquer coisa)
E assim, contigo, se fecha o ciclo...dos três Fs :))
Em Maio, os 600.000 em Fátima.
Em Junho, a febre do Futebol.
Em Julho, o Fado :))
vamos a uma desgarrada???
O Fadinho mora sempre
por castigo
num bairro antigo,
num bairro antigo,
e a seu lado para falar
sempre à vontade
mora a saudade
mora a saudade
quase em frente
numa casa de pobreza
mora a tristeza
mora a tristeza
tem corrido velhos bairros
sempre à toa
mas mora em Lisboa,
mas mora em Lisboa! :))
ah booooca linda :))))
ah fadista ;))
beijos e sorrisos :))
muitos.
Van
Ó Ó Ó sem lágrimas pelas partidas pó seixal?
tava o homem tão sossegadinho a cantar...
;)
Tu, embalas a malta e de repente soltas uma "porra" que a malta até estremece :-)))
Bom fds
Alberto Albertto,
aqui fica, com votos de um bom fim-de-semana, um belo poema do Affonso :)
O teu também é muito belo. Mas isso já não é novidade. :)
O que me parece, é que temos todos de aprender a ser cegos... :)
Começo a olhar as coisas
como quem, se despedindo, se surpreende
com a singularidade
que cada coisa tem
de ser e estar.
Um beija-flor no entardecer desta montanha
a meio metro de mim, tão íntimo,
essas flores às quatro horas da tarde, tão cúmplices,
a umidade da grama na sola dos pés, as estrelas
daqui a pouco, que intimidade tenho com as estrelas
quanto mais habito a noite!
Nada mais é gratuito, tudo é ritual
Começo a amar as coisas
com o desprendimento que só têm
os que amando tudo o que perderam
Affonso Romano de sant'Anna
beijos,
mãe a caminho da reforma :)
legivel,
obrigada pelas tuas palavras
deixo-te o meu melhor sorriso
não posso fazer mais, agora
beijinho muito grande,
alice
PS - O título do Poema é Despedidas.
Mais outro beijo
Tudo perfeito!
(pois...pombos... tenho de ir que hoje há festa em caso de amigos e daqui a pouco cá em casa matam a passarada se não saio do pc!)
Partidas e chegadas, ´e o eterno fado da vida
Sobre o post anterior:
Gostei... exemplo de como se pode fazer um bom post com tempo de menos e uma idéia a mais!
Com relação ao atual... a exclamação do cego já justificaria a travessia feita até cá... pô!!!
Um abraço fraterno.
porra este bloggue e mm bom.
bjo
as amadas em cada porto...
besitos
Para mixtu:
"besitos"?!
Depreendo que "para as amadas"...
O cego exclamou "porra!!" e pensou "ou é forreta, ou é pelintra! uma idéia destas vale bem mais que 10 euros!"...
Cá para mim o Arsénio resolveu experimentar a receita do J.Cristo pensando que com a nota de dez euros fazia o cego ver.
Como o resultado ficou aquém do pretendido, com vergonha, resolveu zarpar num dos botes da marinha, em busca dos muitos braços amnésicos que o fado lhe prometia.
Um sorriso.
Um beijo*
Bom fim-de-semana :)
A dúvida está entre marinheiros e fadistas ou ambos que à falta de discernimento o melhor é não decidir nada.
vim dar-te um beijinho
mesmo
alice
E viva a marinha. De repente não ouvi fado, mas Village People.
Beijinhos
" Ah! todo o cais é uma saudade de pedra." (Alberto, digo Álvaro de Campos)
E todo o marinheiro é uma figura romântica e um Casanova do século dezoito, que se move nas suas sete quintas, digo, nos seus sete mares, deixando para trás "labirintos de saudade".
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