Friday, July 29, 2005

FIM-DE-SEMANA ALUCINANTE

Estávamos a acabar de pequeno-almoçar, quando perguntei à minha-mais-que-tudo -assim como que casualmente, «Onde te apetece ir este fim-de-semana?» e ela sem pestanejar, fixando a ponta da torrada ainda incólume, respondeu no mesmo registo de voz com que me tinha pedido para lhe passar o açúcar, «A Veneza».
Conhecendo-a como a conheço, já devia ter juízo para não lhe fazer perguntas mais ou menos fora do contexto rotineiro a horas tão madrugadoras. Mais uma vez tentei emendar a mão, argumentando pacientemente que decidir ir a Veneza de um dia para o outro, não é a mesma coisa que dizer "amanhã vamos a Paço de Arcos!". E não só; então e "aquilo com que se compram os melões"?, não conta? Que este ano já tínhamos concordado em apertar o cinto, fazer praia em Carcavelos e -esticando um pouco o orçamento, passar cinco dias em Tavira dividindo despesas com o Gigi e a Guida.
Ouviu-me, com olhos de mel, terminou o café com leite e respondeu-me docemente, «Não te zangues, amor; não queres ir este fim-de-semana, vamos no próximo».
Beijei-a rápidamente, peguei na pasta e voei literalmente pelas escadas. Parti uma perna. Vamos passar os próximos fins-de-semana em casa.

Tuesday, July 26, 2005

ANIMAIS com NOME

Hoje voltei a ver a Catarina e quis-me parecer que o sentimento de perda em relação ao Zeca já lá vai. Que no fundo, no fundo, um papagaio pesa o que pesa em termos sentimentais e...confidenciou-me que a Rita Albuquerque «não te lembras dela? que andou com a gente no secundário, uma gaja ruiva, amalucada, que o pai era presidente da junta de freguesia da Ajuda...» lhe tinha telefonado e se dispôs a oferecer-lhe um gato de uma ninhada de uma gata da sua amiga Ofélia «essa não a conheço mais gorda, mas pelo que me diz a Rita é uma rapariga com quem se pode contar nas horas de aperto... de tal maneira que ainda sem lho ter pedido já posso contar com o animal. Agora tenho é um problema; que raio de nome vou pôr ao bichano, que não tenho jeito nenhum para dar nomes aos animais?. Tu é que me podias ajudar nisso, não podes?...que tu és um gajo criativo para essas merdas. Amanhã vou buscar o gato e depois de jantar podíamos ir beber um copo e falávamos sobre o assunto. Ah!, já me esquecia; podes trazer a "tua-mais-que-tudo", que eu sei que ela -embora finja que é superior a essas coisas, fica pior que estragada quando nos vê na converseta. Pensas que eu não a topo? Muito ciosa da sua propriedade essa tua Mona...Depois dou-te um toque, que agora tenho de me despachar para me encontrar com um tipo da Visão que talvez me consiga abrir uma porta para um lugar que vagou no secretariado, que temos de andar sempre em cima destas situações, de contrário um dia destes vou ter de me socorrer do rendimento mínimo...Jinhos! »

«Jinhos» retorqui eu, que nestes diálogos com a Catarina, coisa que eu não gasto é saliva. Ela faz a despesa da conversa, gesticula, sorri, chora, aplaude-se e assobia-se. Gosto dela, mas quando a encontro "é como se estivesse a ver um filme"; ela no ecran e eu a assistir à sua interpretação...

Sunday, July 24, 2005

DIRECTA e INCONTINENTE

Sexta foi noite de sempre-a-abrir e de novos destinos. Éramos seis: o Carlinhos Tátá e a Dokas, o incontornável duo "2-Gs" (o Gigi e a Guida) e este vosso modesto escriba mais a sua-mais-que-tudo-Mona (de Desdémona...).

Jantámos no sítio do costume no Bairro Alto e conduzidos pela Guida que alterna bejecas sem álcool com "as mesmas. com", rumámos a Milraflores ao Relapsus-Bar que nos tinha sido indicado pelo Zé Carlos, um gajo que mora no rés-do-chão do meu prédio, bem falante, cheio de tiques e sem emprego certo. O sítio até estava bem apanhado, pessoal à maneira e musiqueta qb. Estávamos numa de conversa descomprometida, quando por volta da uma hora entraram dois bacanos que me pareceram que já vinham "animados". Um deles, com um corpanzil de rinoceronte, ao passar pela nossa mesa, roçou-se declaradamente pela minha Mona (a minha-mais-que-tudo, se me faço entender...) que não gostou do contacto e não foi de modas, disparando-lhe um «és gordo ou cego, ó boi?!». Antes da resposta do "boi" e quando o mesmo se voltou, já eu me estava a fazer a ele e acto contínuo a ser aviado com um murro na corneta que me fez aterrar na mesa do lado no meio de copos, garrafas e cinzeiros. Estava mais que visto que a confusão era a palavra de ordem. O Gigi e o Carlinhos são duas fracas figuras e quando ripostaram tiveram tratamento igual ao meu. Elas portaram-se bem melhor e ainda ficaram com alguns cabelos dos antagonistas. Quando me consegui recompor, já a gerência nos tinha posto na rua...

Derrotados, mas não convencidos, dirigimo-nos então ao destino final: a Disko-Kobra, em Alfragide. Ambiente ao rubro e um dj à maneira. Dar de beber à dor e executar uns passos criativos fizeram-nos esquecer as marcas físicas e mentais do desaire anterior. Eram quase seis quando saimos. Na rua, ainda deserta, ficaram as manchas escuras do líquido urinário vertido abundantemente como que a marcar território...até á próxima visita. Porque vamos voltar. Jurámos!

Friday, July 22, 2005

EMOÇÕES AO VIVO E A CORES

Ontem não vi a Catarina. Provavelmente trancou-se em casa a carpir mágoas que ela não é do género de mostrar fraquezas à vizinhança. Um pouco como os londrinos, que não apareciam em estado de choque à frente das camaras da BBC aquando dos atentados bombistas do dia sete deste mês de Julho.

Apesar da capital inglesa se situar a poucas horas de distância do solo luso, este modo de estar bem diferente da latinidade portuguesa que não se ensaia nada para arrepelar os cabelos ou uivar de dor pela morte de um ente querido, de uma tragédia colectiva ou de uma figura colunavel mais do seu agrado, em público e -preferencialmente, acompanhada pelos olhos "indiscretos" dos media (embora em tempo recente se lhe deva atribuir um toque de criatividade bem disposta com os aplausos que proliferam em tudo que é são funerais e minutos de silêncio), calou bem fundo nas gentes da informação cá desta banda que à falta de outro material mais "visível" sobre o acontecimento, dissertou sobre as causas de tal postura dos súbditos isabelinos e muito me espantou não ver titulado "Os ingleses não choram!" ou "O que é feito dos sentimentos na velha Albion?!".

Em conversa de matar-o-tempo-que-o-negócio-vai-mal, fiquei a saber que o Rodrigues da papelaria tem opinião formada e fundamentada sobre o caso. Diz ele que "em casa onde não há pão, todos ralham sem razão". Porque não percebi o alcance de tal provérbio adaptado ao assunto, pedi-lhe para ser mais explícito. Explicou-me então, de bom grado, a sua teoria. Disse-me ele que a história da fleuma britânica é uma treta; os tipos choram e desmaiam de emoção como outro qualquer humano deste planeta mais cinzento que azul. Só que(?!) os jornais e a televisão inlglesa vendem-se bem; exceptuando alguns casos de informação sensacionalista, os profissionais da comunicação não precisam de "andar atrás dos dramas privados do cidadão comum" para fazerem jus ao seu vencimento. E interroga-me afirmativamente e irónico , «em Portugal as coisas não funcionam assim, pois não?!».

Pela certa, que este Rodrigues anda a ver demasiada televisão e a ler tudo o que é jornal...

Wednesday, July 20, 2005

DAR TEMPO AO TEMPO

Não se pode contrariar o destino. As coisas são como são, agora só há que olhar em frente ( felizmente Catarina não tem problemas visuais...) e a vida tem de continuar. É verdade que nestes últimos dias tem chorado como uma madalena, que o apetite é quase nada -uma sopa, peça de fruta e um chá, tem sido a base das suas mais recentes refeições e o sorriso que lhe enfeita permanentemente o rosto, desapareceu como por encanto.

Ontem, encontrei-a ao dobrar a esquina do prédio amarelo-torrado onde vive e trocámos meia dúzia de palavras mas sem as gargalhadas do costume. Porque a sei uma bloquista de primeira água, tentei animá-la, contando-lhe das declarações do Amaral que pela primeira vez critica abertamente o seu primeiro, mas-que-logo-a-seguir-desmente-tais-palavras e que pelo andar da carruagem...Tentativa baldada que só recolhi um encolher de ombros e um sumido "que se lixem todos!" que a sua dor ainda é imensa e sobreleva o universo mesquinho das politiquices deslavadas cá do burgo. E ao despedirmo-nos, testemunhei consternado a uma lágrima deslizar-lhe pela face pálida.

Há que dar tempo ao tempo, penso para comigo retomando o meu caminho. Sei da extremada afeição, do amor intenso que ela nutria pelo Zeca. Mas tenho a certeza que mais dia menos dia, Catarina irá encontrar um papagaio ainda mais simpático e falador que este que agora se finou. Quem sabe até, senão, um futuro parlamentar "verde" de raiva pelo "reduzido" vencimento em tempo de vacas magras...