O GATO MASCARADO

... vejo-o quase todos os dias e todos os dias lhe dirijo um aceno amistoso e ele retribui o cumprimento com um miado pouco expansivo mas que reconheço ser de apreço pois não é todos os dias que um cidadão no seu perfeito juízo saúda um animal de quatro patas. Talvez por isso -digamos que, por essa cumplicidade estabelecida entre o homem e o bicho, ontem estive vai-não-vai para lhe perguntar "o que mais desejava que lhe trouxesse o ano de dois mil e sete." Não o fiz porque me lembrei a tempo que os gatos não falam; miam. É verdade que há miados em diversos tons e que, com alguma facilidade, se pode adivinhar o que vai no íntimo dum felino. Mas o pormenor idiomático (e como eu gosto dos pormenores!) apenas será por ventura entendido por um animal da mesma espécie. Mas também não é menos verdade e que, pelo que do bichano conheço, seria capaz de traduzir os seus anseios e expectativas para o novo ano que está a quatro dias de distância.
Para confirmar a minha intuição, hoje de manhã além do habitual aceno, aproximei-me do Gato Mascarado (chamo-lhe assim, devido ao pêlo mesclado de cores quase indefinidas e com algum óleo de carro à mistura... ) e disse-lhe abertamente... «Eu sei que tu esperas um ano menos injusto para ti. Que o gajo do 28, rés-do-chão esquerdo, danado por te instalares no tejadilho do seu carro (último refúgio para te safares da lei dos mais fortes que são os cães), te leva ao engano agitando um carapau de plástico e quando te aproximas ferra-te um valente biqueiro qual ponta-de-lança inspirado. Mas tem confiança que te será feita justiça porque vives num estado democrático e não podes ser agredido selvaticamente. Gostarias que o gato preto (gordo e enormeeee!) da dona Fernanda da sapataria não se afiambrasse aos restos do arroz de peixe que a dona Ilda te deixa tão carinhosamente. Está descansado que isso vai acabar! Quem muito tem, deve partilhar com os mais necessitados e não torná-los mais pobres; que a crise deve ser resolvida por todos... »
O Gato Mascarado que olhava para mim espantado, apenas me disse(JURO!) «Ó pá! Já me podias ter dito há mais tempo que te chamavas Sócrates!»
UM ÓPTIMO 2007 PARA TODOS!!
Almada 2006.Texto e foto de: Alberto Oliveira.