SEM PIEDADE
Impiedosa a chuva não abrandava. Quanto muito, umas tréguas de dois ou três minutos (para grande desconforto e desorientação de Deodato Éfe nas manobras com o chapéu de chuva) e ei-la que voltava mais incómoda e forte que antes. Se o cerco que o inimigo lhe montara se mostrava agora (aparentemente) menos opressivo -a fazer fé na sua vista bem treinada que não distinguia nos dez metros mais próximos ninguém que o quisesse mandar desta para melhor, a formação e a experiência diziam-lhe para não acreditar em milagres e, nem mesmo a informação telefónica de um amigo a dar-lhe conta da vitória do Fátima sobre o Sporting o demoveram dessa convicção. A sua missão estava a chegar ao fim (se é que no mundo da espionagem haja um fim para cada missão, filosofou para com os atacadores dos seus sapatos... ) e apenas à distância do outro lado da rua. Estranhamente, só agora reparava que o sinal verde para os peões, estava sempre vermelho para si. E o homem que garantidamente(?!) era o elo final da cadeia que o tinha trazida a Berlim, avançava agora na sua direcção, ameaçador e disposto a tudo, como se deixava perceber pelas calças arregaçadas. Foi quando o jovem da tshirt laranja e gelado de chocolate e baunilha lhe sussurrou com acentuada pronúncia germânica do norte "É a mim que debes entregar o dbd, ó cromo!". " E a senha? qual é a senha?" inquiriu apreensivo Deodato. "Compra uma senha V-123 que é aquela em que podes biajar em qualquer transporte colectibo que opera na cidade." retorquiu o outro.
Berlim, 2007. Texto e foto de Alberto Oliveira.
28 Comments:
reparei de novo como as cidades
são tristes quando chove...
aqui na foto.
e depois sim, que até os espiões
devem ter crises
de identidade e indecisões...!!
momentos em que os braços
são só braços à espera de homens
supostamente enervados de calças
arregaçadas.
abraÇo.beijO.e.sOl.na.alma.
eTernaMente :)
...mais uma estrondosa gargalhada!!
Uma história bem cromática (já li a anterior também) onde não faltam nem os "cromos" nem a bola ;)
(Aquilo de Fátima só pdoe ter sido milagre)
Beijinhos
Esclareceste-me! De facto, os berlinenses (pelo menos esses) nunca atravessam uma via enquanto o semáforo dos peões não passa a verde. Assim e tendo em conta que aquela senhora é berlinense, o Deodato tem razão em pensar que não há verdes para ele... Só vermelhos! Até já tinha levado um vermelho do Legível, no post anterior!...
Excelentes instantâneos textuais e fotográficos.
Um xi.
ainda bem que não ligou à informação telefónica ;)
cá pra mim o Éfe não devia dar ouvidos a putos com pronúncia do norte, era arregaçar as calças e pular as poças, isso é que era, não foi como salta poçinhas que entrou no mundo do crime?
dulcificada. fico sempre. quando o leio. com ou sem chuva. ardem as palavras sobre o tecto da "sua" cidade.
beijo. "seguramente" para dividir.
Gosto tanto de o ler, que não posso dizer mais nada. Ri-me imenso com o desfecho do texto! lol
obrigada pelo carinho das visitas. Até breve. Um abraço. Azul.
DeoF - nome de código pouco inspirado por que era conhecido na academia de espiões, ali para os lados do Cartaxo - pegou no que julgou ser a sua Frankfurter Rindswurst, que trazia no bolso, e apontou-a ao agente das calças à meia canela. Ou vai ou racha Deo, pensou com a sua salsicha o nosso (!?) homem em Berlim. Tivesse eu praticado mais o tiro ao alvo no Cartaxo e menos o bota-abaixo, suspirou ele ao ver o seu adversário sacar de uma Jagdwurst (modelo mais recente e com maior poder de fogo em dias nublados e chuvosos).
Os dois homens chocaram olhares e faíscas sairam do cabo de alta tensão que alimentava o eléctrico, quando este passou. Se o olhar fulminasse, ninguém sairia ferido daquele confronto: DeoF tinha chegado há pouco da Oktoberfest e não via dez palmos à sua frente, o homem da calça arregaçada era estrábico, e dividia o olhar entre o adversário e a miúda do gelado.
Foi então que um apito se fez ouvir e um policia de ar zangado apareceu. Diz ele ao Deodato em alemão (mas aqui em versão tuga): - Você não sabe que é proibido urinar em público? Meta lá isso para dentro das calças!
Bem tinha parecido a DeoF que a sua arma tinha minguado muito.
Que belas gargalhadas, caro Legivel.
Esse teu Deodato é um malabarista da Jagdwurst, como se viu lá atrás. Agora o que não entendo é, sendo ele espião tão conceituado,como não reparou que o tal jovem de t-shirt laranja é um falso contacto. Sendo um alemão com pronuncia do norte não devia dizer "colectibo" em vez de "colectivo"?
Cuidado com as imitações
1 beijo
Óue sinhóri, que isto di andari eng' transportes públicos cá no nuorte teng muito que se lhe diga... aber, aber ainda lhe aparecia na foto a floribela chamando pelo sinhóure fritadeira.. fredererico... friztdasnaoumseiquantas! que também é alimão!
cidades... a chuva... lava-as e pode-nos fazer esquecer todas as senhas de entrada mas não as de saída...
abrazo europeo
ai mas que caras!!
os gelados estarão estragados...?
é que parece mesmo que os dois vão
romper em pranto simultâneo...!
...
:)
é... só fui confirmar o beicinho.
sim sim já vou ind...o...
Agora estava a pensar
"Sem Piedade" ... então e a Cova (da), onde está ???
Ok, ok, já atirei os foguetes e vou apanhar as caninhas :-) .
beijinhos (acrescento um para o Rui que como sempre apanha sempre as tuas histórias de uma maneira fabulosa - e tu as dele ...)
Gosto deste agente secreto. Tem estilo! E o contacto alemão com sotaque do norte tambem nao fica mal, nao senhor!
:))))
bjs
nunca fiz um inter rail.. mas gostava..
já gelados.. nem no verão.. eu sou mesmo mais bolos..
quanto ao fátima.. não tinha já ganho ao porto também?!
Ele ainda há milagres no pobo, como esta de uma senha sem sanha, que serve para quem a apanha!
Muito bom, este Marialva dos espias. Abç
eu só te olho de esguelha!...
Primeiro, foi o milagre do sol.
Depois, alardeou-se na pastorícia.
Agora és tu quem me salta ao caminho com o futibúlio!
O que te salva é aí o lerdo laranja
a reinar com os cornétes!
Chuva, chuva e mais chuva, isso, por vezes, até sabe bem.
O que eu andava a perder com a malvada da falta de tempo! A saga do Deodato, o da Mouraria, de Barrancos e da Alexander Platz. Sinhores, o homem tem passado por grandes apertos. E a chuva, sempre a chuva ensopar-lhe as calças e os sonhos.
Será que com esta passagem de senha terminou a missão possível?
Mas o do gelado à chuva é ainda uma criança. Como pode ter sido tão pronto a botar a contra-senha?
Eu chego a acreditar que tu filmaste isto tudo entre Leça e Matosinhos. Que és fotógrafo e policialógrafo para isso e muito mais.
Que a senhora do Fátima que venceu os Leões te cubra de bênçãos por todo o divertimento que nos proporcionas.
Disfarces da espionagem.
Um abraço. Augusto
como gosto de berlim..a Kurfürstendamm. com ou sem chuva.
para rach:
O teu reparo, revela uma intuição fora do comum para estes cenários de grande dramatismo. Não sei o que mais admirar: se o alcance auditivo paranormal, se a velocidade de raciocínio mais rápida que o som. De qualquer modo, já corrigi no texto, colectivo por colectibo. Bem hajas!
1 (um) beijo e sorrisos.
... e a mim que não me dá jeito nenhum comer gelados quando chove!?
talvez sejam as cores dos gelados que não combinam com as dos guarda-chuva
hum... deve ser isso
É o pronúncio do nuorte, carago!
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