Wednesday, November 15, 2006

... PELA MEDIDA GRANDE.















Ele há gostos para tudo, como é sabido. Mais: eles (os gostos) não nos devem ser impostos, muito menos naquilo que à mesa se refere. Reparem que não escrevo alimentação mas sim mesa. São coisas diferentes e cada uma delas com preparação pedagógica diversa. Da alimentação saudável, trataram os meus mais próximos e, com nota máxima. O inenarrável luso bife de vaca ( deixando-se montar pelo refulgente ovo estrelado) e acompanhado das loiras batatinhas fritas e os linguados grelhados, fizeram as minhas delícias gastronómicas de infância. Do prazer da mesa, fui aprendendo ao longo dos anos que me conheço, também com idêntico prazer; do gosto das vitualhas e do sabor da conversa que acompanhe qualquer repasto que se preze.
mesas que são uma monotonia pegada: come-se rotineiramente e depois boceja-se, porque o menú se repete até à exaustão, género "cozido à portuguesa às quartas-feiras" e porque o tema do diálogo se esgota na crítica feroz a quem tem o azar(?!) de não estar presente ou na relação "Merche Romero-Cristiano Ronaldo". Noutras mesas, descobre-se na lista "pescadinhas fritas de rabo-na-boca (que já não se deixavam comer há tanto tempo!) com arroz de cenoura" e os comensais chegam à conclusão (após demorada e fundamentada discussão) que afinal os anjos sempre tiveram sexo... entre eles. Porque há gostos para tudo, preparo-me sempre antes de ir para a mesa: psicológica e intelectualmente. Não vá constar na ementa, "aqui come-se... pela medida grande".
Milão, 2006. Texto e foto de: Alberto Oliveira.

24 Comments:

Blogger Peg solo said...

Milão =) e essas coisas das comidas, mesas e refeiçoes tem muito q se lhe diga. ficaste a lavar pratos foi?

16/11/06 00:57  
Blogger APC said...

Dos prazeres na mesa aos prazeres à mesa vai uma grande diferença, vai!...
[Gostava tanto de ver o teu blog antigo!;-)]

16/11/06 01:45  
Blogger sotavento said...

Ainda bem que frisaste ser de mesa que se tratava, porque essa coisa dos anjossexuais deixou-me de boca aberta!... :)))

16/11/06 14:20  
Blogger mfc said...

Galerias Vittorio Emmanuele... nem sempre se pode ter um repasto por estes lados!

O que dizem na mesa ao lado? Já a prendi a não me incomodar, mas a gozar interiormente com isso. Tornou-se um ritual para quem almoça só!

16/11/06 15:26  
Blogger Rui said...

G. Barovsky saiu apressado do comboio. Não suportava espaços fechados, mesmo que estivessem em movimento. Ao passar o enorme pórtico de Milano Centrale, o sol cegou-o. Também detestava isso: não ver e ser apanhado desprevenido. Em poucos dias era a segunda vez que lhe acontecia. Tens que ser mais cauteloso Bary, pensou para si. O episódio de Innsbruck não lhe saia do pensamento, por pouco não tinha sido apanhado numa das suas muitas missões de espionagem industrial. E logo por um simples mas curioso e atento, turista. Ah Bary, que devem ser os anos a pregar-te partidas…
O táxi deixou-o nas galerias Vittorio Emanuele, seu local de peregrinação sempre que ia a Milão. O seu porto de abrigo, como costumava dizer. Sorriu de satisfação, antecipando a refeição de que em breve iria desfrutar no Bar-Enoteca Ristorante Il Salotto (o que o levava lá era não tanto a parte do Bar e o Ristorante, mas antes a da Enoteca).

Um lugar na esplanada, óptimo. G. Barovsky afastou a cadeira, despiu o seu casaco de bombasine castanho, totalmente demodé, e sentou-se com um suspiro profundo. A camisa azul-tripeiro transpirada, denunciou alguma ansiedade. Aqui ninguém me apanha.

- Buon giorno signor, che vuole pranzare?
- Speak English?
- Of course, signor. I was asking about lunch…

G. Barovsky interrompeu-o com um gesto brusco.

- Na Lombardia, sê lombardo! Pode ser salsichas frescas enroladas.

Perante a cara de espanto do empregado, G. Barovsky coçou a cabeça.

- Oh diabo, como é que se diz isto em inglês?

Não longe dali, um incauto turista - que não acreditava em coincidências - preparava-se para mais uma fotografia de férias.

16/11/06 17:19  
Blogger bettips said...

Curiosidade desenrolada, da foto às palavras. Perfeito este sorver os sentidos das coisas! Ah e petiscar, falando e rindo... Como aqui no teu espaço. Abç

16/11/06 18:33  
Blogger JPD said...

Belíssimo!!!
(cá para mim, e ninguém nos há-de ler, o Pantagruel nunca foi de confiar!).
As rotinas são esmadoras.
Sabemo-lo todos.
Estou de acordo contigo: há que valorizar as refeições e cuidar delas, antes, durante para que o depois seja o melhor desejado.
Imagina que chegou a pensar-se fechar a Rua Augusta como aí em Milão...(Lembras-te de ter sido comentado?)
Ciao!!!

16/11/06 20:03  
Blogger Maite said...

Caro Legível

Seja cozido à portuguesa ou pescadinhas de rabo na boca (comida mesmo), quando aliados ao prazer de uma boa conversa são capazes de fazer esquecer ou diluir mesmo os ambientes menos agradáveis. (Essa será sempre na medida maior) :)

Tenha uma boa noite

16/11/06 22:42  
Blogger Teresa Durães said...

hum... porque me cheira a estrume???


(bom, sou lacto-vegetariana com ovo estrelado sem bife!)

e de pescada de rabinho-na-boca psicologicamente preparado quando os anjos sempre fizeram sexo entre eles... mais nada digo!!!

(mas que me pareces terrivelmente terrível, ai pareces sim!!)

e mordaz, ora lá!!

eheheh

e bem escrito, claro!

16/11/06 23:32  
Blogger Maria P. said...

"Porque há gostos para tudo, preparo-me sempre antes de ir para a mesa: psicológica e intelectualmente."

E fisicamente não há preparação?!!!

17/11/06 00:17  
Blogger Sofia said...

Beijos e bom fim de semana para ti tambem!!!

;)

17/11/06 09:58  
Blogger Joana said...

Pataniscas de bacalhau com arroz de feijão encarnado, sobre uma toalha ao xadrez encarnado... ai! por mim os anjos podem andar entre eles, a pescada pode continuar a morde o proprio rabo e o ovo estrelado pode ser a estrela polar do bifito... mas as minhas pataniscas de bacalhau com arroz de feijão encarnado... essas ninguém mas tira! :)

bjs e bom fim de semana!
:)

17/11/06 11:45  
Blogger A. Roma said...

Espero que a mesa seja forte. não vá quebrar!

17/11/06 12:48  
Blogger isabel mendes ferreira said...

é. é mesmo.


mas o contrário tb.
:)))))
____________


beijos. prazenteiros.


desejo o mesmo.

17/11/06 12:56  
Blogger Licínia Quitério said...

E lembrei-me daquela velha anedota do menino pobrezinho que disse para a mãe: Ó mãe, panquecas é tão bom!!
E a mãe: Comeste, meu filho?
E o filho: Não, mãe, vi comer.

Vá lá, ao menos sorri, faxavor.
Não estou inspirada para cartas deliciosas como a que deixaste no meu Sítio.
Eu, com os polegares, nem para a barra de espaços (rssss ...)

17/11/06 17:48  
Blogger passarola said...

hummm.. e que tal um restaurante onde se escolhe o prato em função da conversa.. "então, sobre que é que os senhores vão falar hoje?.. Merche-romero?.. Salta um croquete para este senhor.. E o senhor? De viagens à lua? Salta um linguado grelhado, para este..." ;)

17/11/06 19:49  
Blogger 919 said...

ora convenhamos, que, às vezes, uma boa malga de salmão acompanhada de um leve e divertido corte-e-costura até fazem um bom bocado!...

17/11/06 23:02  
Blogger tb said...

os prazeres da mesa e outros mais, num olhar agri-doce espalhado até à extremidade dos dedos que comandam as teclas.
jinhos

17/11/06 23:45  
Blogger Fragmentos Betty Martins said...

Estar à mesa é muito mais, que o simples acto de comer.

Eu vou mais pelas saladas - e uma boa conversa e claro está, uma boa companhia:)

Pergunto:como é que os anjos fazem sexo? Eles não têm sexo!!! Ou então alguém me tem andado a mentir!!!:))

Beijinhos com carinho
BomFsemana

18/11/06 00:58  
Blogger esse said...

Pois não é que na semana passada me sentei num banquinho de jardim, com uma sande e uma coca-cola natural, que não tinha onde a manter fresca, sentei-me dizia eu, sozinha num banco do jardim e estando a meditar na vida fácil e feliz dos passarinhos, me aparece um pobrezinho, daqueles mesmo pobrezinhos, rotos e sujos, com a sua vida num saco de plástico e me estende a mão! Ora, estando eu a meio da minha refeição e sem trocados, acenei-lhe que não... mas ele, persistente, continuava com ela estendida como que a mostrar-ma. Uma mão branca, numa roupa suja e rota.
Pois meu caro amigo, deixe-me que lhe diga que este pobrezinho me pediu para trocar o resto da minha sande por uma maçã, e quando lhe dei a metade da minha sande, partiu-a aos bocadinhos e espalhou-os à nossa volta... não conto o resto ... dos passarinhos nos terem rodeado e de termos ficado ali durante a hora do almoço a olhar os bocadinhos da minha sande a serem pescados por aqueles pobrezinhos e de como, por momentos, nada foi mais importante do que aqueles pobrezinhos...

E quando me levantei, meu amigo, senti que a pobreza, a verdadeira, se sentava, muitas vezes, à mesa...

18/11/06 05:51  
Blogger segurademim said...

... cá também!!! experimenta ir ao Gambrinus

são só cartões dos encartados despesistas, desbaratadores dos dinheirinhos públicos... dos nossos sofridos descontos no salário, à cabeça

qual pescadinha de rabo na boca

;)

18/11/06 12:10  
Blogger Teresa Durães said...

e descubro pela medida grande que afinal, como um dia o vento sussurrou, as múmias existem. Talvez sejam da idade dos dragões komodoro, os tais que adquiriram o ro nas trapalhices habituais de quem escreve num poleiro. Facto facto é que esses dragões não bebem Guiness o que é uma pena pois é acompanhada de música atraem os dragões fantásticos (que não do tonto do S. Jorge).

assim se fazem as noites

19/11/06 18:27  
Blogger Unknown said...

Coincido contigo respecto al placer que da una mesa bien servida , por supuesto con los alimentos que a uno le gusta .Hay mucho placer .

Un abrazo y
buena semana

Adal

Muchas gracias

19/11/06 23:25  
Blogger Ricardo said...

Caro,

Confesso que nunca tinha reflectido em tal assunto, contudo agrada-me a sua catalogação e sentido crítico em relação aos menus que às vezes vêm com a alimentação. Por vezes é com cada indigestão...
Mas desculpe que lhe diga, umas pescadinhas de rabo na boca, no sentido literal, são cá um petisco, espero que não tenha nada contra.
:)

21/11/06 19:22  

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