O MEU AMIGO WOLFGANG A.
Tínhamos aprazado o encontro para uma praçazinha simpática e deslocada do bulício do centro da cidade. Ambos sabíamos que por esta altura do ano os festivais de música traziam milhares de forasteiros à grande urbe e Wolfgang confessou-me na breve conversa que mantivemos por telefone móvel -uma invenção diabólica segundo ele, que temia ser reconhecido no meio da multidão por A. Salieri. Tentei sossegá-lo afiançando-lhe que o seu rival estava bem morto e enterrado mas isso não o aquietou. Para meu espanto, informou-me que viu um espectáculo de magia, numa sala completamente às escuras, de um tal Milos Forman e que o enredo não o tinha deixado nada animado.
Tive algum receio que, depois de tantos anos não o reconhecesse com facilidade. Na realidade, a única fotografia que tinha dele, datava da altura em que teríamos entre os seis e os oito anos. Numa rua de terra batida via-se em primeiro plano o Bastos B. a rematar uma bola de trapos contra um indefeso guarda-redes de joelhos esfolados que era eu. Nas minhas costas, alheio ao jogo, Wolfgang tocava violino. Nas voltas da vida a última vez que nos falámos, foi na vã tentativa de lhe encomendar (a preço de amigo, claro!) um hino para a Associação Cultural e Recreativa os Amigos de Afrodite. Recusou, invocando uma viagem à Casa da Música no Porto.
Afinal os meus receios não tinham razão de ser. Ali estava ele, e no rosto liam-se a dois tempos, uma aparente serenidade e o olhar distante do virtuoso. O pessoal do marketing desta terra não deixa os créditos por mãos alheias...
Viena, 2006. Texto e foto de: Alberto Oliveira.
23 Comments:
Parece que o tempo não passa por ele!...
:-)
Caro Legível
:)))))
Como a Alfazema, voltarei mais tarde para ler com mais sossego.
Tenha um óptimo dia :)
sabe que afinal "eles" não eram como se diz no filme????
ah pois não...
(ainda bem que falaram...)
beijos em allegro...
Realmente, ele há cada um!... Não lhe custava nada ter feito um simples hino!... :|
Há quem fique sempre.
Para sempre.
Sempre gostei de te ler também.
Adivinha-se o tamanho do coração nas entrelinhas que nunca escreverás aqui, embora por vezes se soltem fugidias, as notas de um som...
Não, não é o Wolfgang...mas bem que poreia ser ;) pelo estilo legivel das notas ;))
...é o pulsar do coração, onde entre fotos e mapas de viagens, guardas também esses bons sentimentos!
Van
Amadeu passou os dedos pela testa. Ainda lhe doia e o galo teimava em não baixar.
Sentiu-se mais tranquilo quando o comboio passou a fronteira austriaca. Invadiu-o uma sensação de tranquilidade. Tinha tomado todas as precauções para não ser seguido e agora estava a chegar a casa.
Pouco depois da fronteira, o comboio deteve-se. Amadeu espreitou pela janela e pode ver que no apeadeiro mal iluminado apenas estava uma figura, que lhe pareceu sinistra.
O sentimento de segurança deu lugar a um nó nas tripas.
Não demorou muito a que a porta do seu compartimento se abrisse. O homem do apeadeiro estava agora à sua frente, a face escondida na sombra de um chpéu de feltro.
Sem retirar o oleado que o tinha abrigado da chuva, sentou-se à sua frente.
Ao retirar o chapéu, Amadeu teve um desfalecimento. Não reconheceu a cara mas soube que já se tinham encontrado.
O homem falou por entre um sorriso:
- Boa noite, o meu nome é F. Murray Abrham...
Amadeu deixou escapar um ai e desmaiou.
Wolfgang deveria ter uns motivos muito seus, não sei.
Mais uma vez gostei do que li
(acho que anda a me escapar algo mas decidi ir pelo sorriso)
li e reli
está excelente o texto
mas agora retiro o que disse sobre o Wolfgang. o que está entre parênteses mantém-se
Olha...GOSTEI!
Para uma noite plena de Paz…um beijo azul
BlueSell
bem inspirada essa prosa e o amigo Mozart não merecia outra coisa.
Um abração
Vejo que a música está a lhe atiçar os miolos. Não que tenha algo algo contra a música... ou os músicos! - teu amigo Wolfgang então!... mas além da música consegues encadear um outro elemento deveras interessante... e através desse outro elemento venho a saber que nutres uma paixão futebolística... com quê então - antes de nascer um fotógrafo de imagens e palavras havia um guarda-redes...
Deixo o meu abraço fraterno e saudoso.
nããã... cá pra mim, o Mozart foi ver a branca de neve a preto e negro e ficou assim com os olhinhos meio piscos...
... mesmo ausentes os amigos, companheiros de sempre, estão na nossa vida, presentes, surgindo-nos com ou sem encontro marcado
é delicioso quando surgem inesperadamente ao virar da esquina
o problema é quando tropeçamos com os Salieris e não sabendo que o são, confiamos ...
;)
Será que lhe podes pedir para fazer um hino para o meu Boavista? O nosso é tão fraquito. Anda lá mete uma cunha!
bjs
engraçado que ainda onteme stive a ver uma foto, com uma montagem a partir de uma partitura desse Sr.
:) beijo
Um festival de música em Viena de Austria, eclipsa qualquer jogo :D
Talvez há cerca de um ano que eu sou leitor assiduo deste blog. Apesar de não ter o hábito de o comentar, gostaria de dizer que gosto imenso do blog, a começar pelos títulos dos posts.
Abraço
Caro Legível
Uma história muito bem engendrada em que o passado e o presente se interpenetram de uma forma divertida :)
Sabe que do filme de Milos Forman guardo as espantosas gargalhadas de Mozart como imagem de marca desse filme? :)
Tenha um esplendoroso (posso até ouvir esta palavra na boca de Mozart) :) fim de semana :)
Li..
Reli..
Todos os textos que escreveste enquanto andei por terras do Jardim.
Que dizer?
Inveja! Uma grande inveja por teres estado em Veneza e Lubliana.
Imagino-me sentada na Praça de S.Marcos a escutar Mozart, Vivaldi ou um simples e bem tocado Jazz ao fim da tarde.
Ou a bebericar um chá no «Florian».
Um sorriso e um beijo*
Sabe que frase linda encontrei aqui??
"Nas minhas costas, alheio ao jogo, Wolfgang tocava violino."
Por incontáveis razões...
Beijos e bom final-de-semana!
Que inspirado estas.
Que bom o teu texto.
Gosto especialmente do sorriso algo irónico que adivinho em ti quando escreves.
Sente-se esse sorriso nas entrelinhas.
Muitissimo inspirado e inspirativo, parabéns.
Lá para os meus lados hoje é dia de histórias para crianças e adultos.
Vem ler, és sempre bem vindo lá em casa.
Isabel
Esta conversa sobre o seu amigo Wolfgang A. Mozart, fez-me recordar o dia que visitei Salzburgo. Não encontro palavras para descrever, foi qualquer coisa de maravilhoso... Voltaria lá, pois a visita foi curta e, aquela cidade tem muito que visitar.
Mas, prometi que no fim de semana vinha visitar os Amigos, pois agora durante a semana, o tempo é curto e o cansaço não me deixa estar na net...Cá estou.
Abraços.
Pelos vistos continuas com a fantasia do habitué. e já reparei que ainda tens papel.
Mozart é um dos meus compositores favoritos, assim como o filme Amadeus de um tal Milos Forman, que volta e meia até tem uns movies todos catitas. Agora, e como a Mendes Ferreira referiu, não consta que Salieri e Mozart fossem inimigos, pelo menos segundo alguns entendidos na matéria. a versão romanciada do Milos até que nem estava nada má.Do fime fcou-me a gargalhada do Mozart, a sua loucura e infantilidade e acima de tudo a sua enorme paixão pela música...e um Requiem em construção...
Mas, caro Legível, esse tal de Amadeus não se deslocou ao Porto, por acaso, de comboio? É que pareceu-me tê-lo visto no comboio com destino a Campanhã enquanto locava uma violinada e cantava parte de uma opera bufa "Viva o Momento Now"
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