O MUNDO a SEUS PÉS (Parte Um)
Um dos maiores prazeres de Deodato, é o de entrar nas sapatarias. A maioria das vezes, experimenta cinco ou seis pares de sapatos e após isso, conclui, com ar de contrariedade (que representa sem esforço), perante o empregado solícito que «Os níveis de conforto que pretendo, não correspondem às minhas expectativas e a relação qualidade-preço, deixa bastante a desejar. Nada feito meu amigo!» Antes, ao entrar, pede calçado um número abaixo, do que de facto calça. É um dos truques que mais utiliza para ganhar tempo. Afirma convicto, que não entra numa sapataria para gozar deliberadamente com quem trabalha; e reforça: isso que fique bem claro!
Filosóficamente, diz para quem o quer ouvir, que "estas lojas têm um encanto muito próprio, porque as pessoas que aqui se encontram, tem modos de agir muito interessantes e fora do comum", daí a sua apetência por permanecer o máximo de tempo possível, observando-as, explica. É para elas que centra todas as suas atenções e cada vez se espanta mais com o que vê e ouve. Tem um roteiro completíssimo (e actualizado... ), de todas as sapatarias na área da Grande Lisboa e um esquema de visitas organizadas, de modo a não as repetir num curto espaço de tempo... Ficou-lhe de memória, a memória de elefante de um empregado de uma sapataria da Almirante Reis (que Deodato confundiu com outra na Morais Soares) ...
Numa fiada de lojas diversas, Deodato entra de olhos fechados naquela que é uma sapataria; o odor dos desodorizantes aéreos, para anular os que emanam dos pés da clientela mais avessa à água, é característico e indisfarçavel. Louva a coragem e a humildade dos que trabalham neste ramo, quase sempre em condições adversas, diariamente acocorados, qual posição de vassalagem perante chispes & presuntos , uns mais nobres que outros, mas todos (ou quase) republicanos. Afiança por tudo, que faz todos os possíveis (não fala em "impossíveis"... ) para não se sentar em frente a uma senhora de saia mais curta que o habitual. Se isso acontece, desvia candidamente os olhos, e canta em surdina "A Portuguesa" .
Foto de: Alberto Oliveira.
35 Comments:
Nããã... Cá pra mim, o verdadeiro prazer do Deodato, ao experimentar sapatos de tamanho inferior ao do seu pé, é o alívio que sente quando os descalça...
A primeira, de novo! pois se o caro Deodato tem essas manias que ao menos se diga que terá tantas vezes sido recebido por uma fila de caras especadas do alto das quais, ele, Deodato, se vê olhado no esforço de calçar o sapatito. Por vezes, lá se dobra uma mão com uma coisa metálica que mais parce um forcépes, ao mesmo tempo que uma voz quase grita "com isto talvez seja melhor". Sim, que isto de se afirmar que ele "Louva a coragem e a humildade dos que trabalham neste ramo, quase sempre em condições adversas, diariamente acocorados, qual posição de vassalagem perante chispes & presuntos..." é estar a situar a acção em outro tempo que não o actual. Será?!
Caro,
Ainda há dois dias entrei numa sapataria numa das ruas que referiste. Será que poderei ter tido o prazer de me cruzar com o Deodato sem o saber?!
A partir de agora vou passar a olhar com atenção redobrada para as pessoas que encontro numa sapataria, nunca se sabe quando poderei encontrar o meu miguito deodato! Era algo mto interessante e que me daria um sorriso.
Um beijo grande
Agora já sei quem é o Deodato, parece autista, é muito interessante o seu comportamento.
Vou ter a audacia de te sugerir um livro, gostei muito de o ler.
"O homem que confundiu a mulher com um chapeu" de Oliver Sacks (Ed. Relógio D'agua)
Gostei muito do texto, fico sempre a pensar neste tipo de pessoas e comportamentos, são intrigantes e ao mesmo tempo tristes.
Muitos parabéns à tua escrita!
Beijo
Ainda ontem entrei numa sapataria. Fui com uma amiga que literalmente colecciona sapatos. Resultado: cerca de uma hora a calçar e a descalçar sapatos liindoos de festa e também caríssimos.Dada a variedade e o preço, resolvemos vir para casa marinar a decisão antes de nos "espetarmos" e comprarmos o par de sapatos errado.A empregada fez uma cara de "frete" : "estas estiveram aqui passar o tempo e não levam nada..." A senhora da sapataria deve lidar com muitos Deodatos e pensa que todos os clientes que entram e não compram nada são Deodatos. Conclusão: nós íamos mesmo comprar os sapatos (ás tantas ainda hoje), mas atendendo à má cara da senhora, resolvemos ir a outra loja do grupo...
Ai os sapatos..........olha são a minha perdição confesso!
(escreves bem!)
bjs
O de_o_dato, podia ser: dê ó gato! de tão pequenino que é, ia-lhe chamar um figo!!!
Sapatos? não sei se tenho para o número dele...
por acaso até conheço essa dita da chispes & presuntos uso muito quando faço a feijoada, bem afamada! com resssmas de absolutamente!
;)
Desconfio que, apesar de tudo, o Deodato não consegue evitar o astear da bandeira quando chega à parte do marchar, marchar...
O tipo da foto tem todo o ar e agente secreto. Há mais nesta história do que aqui se contou...
todo o ar DE...
Deodato és um esquisto e preverso, eu entao detesto estrear sapatos, porque comprar até os compro usar é que demora o seu tempo...
Que desperdicio de tempo estar assim sentado numa sapataria.
Agora desculpa-me Deodato, vou calçar os chinelos, com licença..
Beijos com carinho.
oh, valha-me deus! Não querem lá ver que eu, sem saber, tenho uma Deodata dentro de mim? Bem, eu explico: é que também eu adoro sapatarias, porque na verdade, sou amante de sapatos bonitos. Vá-se lá saber porquê, mas a verdade é esta. Podia da-rme para pior, não era Caro Amigo Legível? lol
Bem sei que comentou a peça que entretanto já foi ver. Ainda bem que também gostou. Fico feliz de saber. E por falar em "feliz", não sei se a felicidade terá cor, menos ainda se é azul, mas para já, obrigada pela parte que me toca, pela associação que faz a meu propósito. Na verdade, tenho andado a pensar (descobrir) que a felicidade podia ser uma folha de árvore. E se fosse, seria das caducas. Ao invés dela, temos a satisfação, que na qualidade de folha de árvore, será perene. Qual a cor de cada uma, não sei (ainda), mas fica a promessa que, se vier a descobri-la, você será o primeiro a saber.
Um grande abraço para si. Até breve. Azul.
Nem Orson Welles contaria tão exemplarmente esta história.
Aguardo parte dois.
Eu acho que este apetite insaciável de experimentar sapatos reside na necessidade ainda por satisfazer de encontrar o par tão leve que finalmente garantirirá a insustentável leveza do ser...do ser do deodato, evidentemente.
Um abraço
mimo extremo à base do nosso mundo...se não cuidarmos desta não poderemos andar, nem para a frente nem para trás, mas sempre poderemos ambicionar ganhar asas para não ficarmos desamparados sem o calçado adequado ao nosso andar...vou beber um red bull....bxox
Legível ...andas aos saldos?
A Clotilde sugeriu um livro, que por acaso também já li e achei deveras interessante. Reforço aqui a sugestão dela, se me é permitido...
Ora bem; melhor que o cheiro a couro e a cabedal, é o cheiro a merceearias antigas, com aqueles armários que cobriam todas as paredes. Julgo que ainda há alguams para os lados de Alfama ou na encosta do castelo.
E só por causa desse título, o orson Welles deu quatro voltas na tumba. Shame on you!
Para lélé:
É bem possível. Com este Deodato, nunca se sabe; arranja cada distração mais fora do comum...
Para seila:
"Esta acção" desenrola-se na actualidade. provavelmente, o que quererias escrever é que já ouviste falar no Deodato de outros tempos. É verdade. E também é verdade que o sujeito me continua a contar as suas aventuras e desventuras, que depois eu lhe dou uns ornamentos...
Para mulhergorducha:
Caríssima:
Quem sabe se não te cruzaste mesmo com ele...
Há dois dias ele esteve apenas!? em duas sapatarias; na "Palmilha d´Ouro", no Areeiro e na "Sola de Couro" no Alto do Pina. Isto, a acreditar no que me relatou...
Talvez o encontres um dias destes; tudo é possível que esse teu amiguito é fácil de identificar... pela singularidade do nome e de andar sempre com um sorriso ao canto da boca.
Beijo grande.
Para clotilde:
Pronto. Assim já estás prevenida, se esbarrares com ele na rua ou... no interior de uma sapataria.
Creio que já folheei quaquer coisa desse Sacks; o nome diz-me qualquer coisa mas não tenho nada dele. A próxima vez que entrar numa livraria vou estar atento. Comportamentos intrigantes... pois...
Beijos e um óptimo fim de semana!
Para maria papoila:
Se me disseres o nome da pastelaria (perdão!, onde ando com a cabeça...) da sapataria posso saber se o Deodato passou por lá. Pelas pistas que dás, não me custa nada a crer...
"... foram para casa "marinar" a decisão..." . Pois. Depois eu é que conto histórias estapafúrdias...
Para sofia:
Eu sou mais para os Ferraris; não me importava de ter um, mesmo que passasse o resto da vida descalço... Reparavam-me lá nos pés!
Bjs.
Para @:
Já somos três; tu, o Deodato e... eu. Não é por acaso que sofro dos calos...
Para segurademim:
Tenho cá uma vaga ideia, que a minha amiga me goza à força toda; e não é de hoje nem de ontem...
Essa de " dê ao gato..." seria muito espirituosa se eu estivesse a escrever sobre sardinhas. Tudo isso para me chamar a atenção que a sua feijoada tem " montess de absolutamente... ". E se em vez de apregoar virtudes pantagruélicas me convidasse para tão afamado petisco?!
Para rui:
O "hastear da bandeira" é que me parece ter no seu comentário outra conotação... patriótica, para não lhe chamar outro nome...
O meu amigo Deodato sempre foi assim; lúcidamente inigmático...
Para lagoa azul:
Se adivinhasse que a minha estimada amiga sofria assim dos seus graciosos pés, não teria contado esta história do meu amigo Deodato.
Não fique impressionada, não?
Tenha um descansado fim de semana.
Beijos.
Para azul:
Oh! minha amiga!! "uma Deodata dentro de si?!". E isso não é incomodativo??
Há realmente muita gente que tem uma grande atracção por sapatos. Recomendo-lhe um livro a propósito: "Amor com Sapatos", de Eduardo Brum, Publicações Europa-América. Não é obra para Nobel, mas é muito curiosa e... tem sapatos....
Aguardo em ânsias, a sua comunicação sobre a coloração das folhas de árvores e fico muito feliz por ser o primeiro a sabê-lo...
Um grande abraço também para si, Azul. Até breve.
Para pé:
Welles (Orson) é uma referência. Tal como Roy Orbison, Krist Kristofferson ou June Alyson. Procuro, humildemente, seguir-lhes as pisadas (na escrita, na música e na representação), se possível... confortavelmente calçado.
Para jpd:
Caro José:
Muito interessante este teu comment; da "insustentavel leveza do ser (ou estar... calçado) à do ser Deodato. Ser ou não ser, estar ou não estar confortavelmente calçado... Mas olha que o Deodato é pró peso-pesado...
Abraço.
Para phi@:
Seré sempre o último recurso quando não se consegue calçado que se adapte ao nosso andar: ganhar asas. Eis mais uma fórmula (a tua!)para (de uma vez por todas) resolvermos o embróglio dos sapatos.
Fica apenas uma pergunta: há assim tantas lojas a venderem asas como há sapatarias?! Já fui às "páginas amarelas" e... nem uma para amostra...
Beijos.
Para i & c:
Aos saltos?! Mas porque haveria de andar "aos saltos"?! se não me saiu o "euromilhões" nem aquela tia rica que vive em Viena (ou Viana?) se aborrece de morte com o que vai por este mundo fora...
Para lélé:
Tá bem Lélé; um reforço vem sempre a calhar. Que a memória já não é a mesma de outros tempos... Mas... o livro era sobre yoga?!
Pronto, pronto. Eu volto atrás...
Para i & c:
... e a visão também já não é nada famosa...
Escreveste saldos e eu li saltos; ái ái...
Para vodka e valium 10:
Acho que sim que ainda há; mas poucas...
Se mantivesse o peso dos últimos anos, nem meia volta dava... Sou um desavergonhado! Está-me na massa do sangue...
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