NAS ALTURAS
Desculpava-se com imaginárias vertigens, para o costumeiro hábito de não olhar para as alturas (é sabido que tais tonturas, não acontecem somente quando os nosso olhos descem para os abismos reais ou fictícios que nos cercam... ) e reconhecia que esse seu comodismo -que assim se designe para não sermos acusados de penetrar, sem convite, nos domínios do privado mental de Deodato, comportava alguns custos.
Os relatos das suas viagens eram célebres e alvo de grande gozo por parte de amigos e conhecidos porque descritos na horizontal. Do Empire State Building conheceu a entrada; em Pisa, da Torre não confirmou a inclinação que se lhe atribuia. E no seu dia-a-dia as coisas também não se afirmavam pacíficas; na Companhia onde trabalhava, convidaram-no para integrar uma equipa de basquetebol; que não, obrigado; se ainda fosse de futsal... E que não lhe pedissem para retirar um livro de uma estante mais elevada que a sua própria altura...
Ontem, ao descer a Rua do Carmo, o impensável aconteceu. Não nos vamos deter na explicação de tal desígnio que este não é o momento nem o espaço certo para tal. Sem saber ler nem escrever, Deodato ergueu os olhos para o ar e para além da estrutura de ferro fundido do elevador de Santa Justa e do cimento do imóvel paralelo, descobriu pedaços de céu azul sem mácula. Sorriu satisfeito. Raoul Mesnier seria um aprendiz ; mas quarenta e cinco metros de altura, valem o que valem. E Gustave Eiffel e o seu engenho, em Paris, estavam vingados...
Foto de: Alberto Oliveira.
42 Comments:
:)
Belo texto e bela fotografia!
Boa semana por aqui!
Oh caro amigo legível, não me diga que o Deodato, em face de tão nobre estrutura, perdeu finalmente o medo das alturas e, sem esperar, desejou rumar ao azul do céu?!
Bela imagem. Um abraço para si. Até breve. Azul.
Bela imagem!
Sou como o Deodato, detesto alturas! Mas adoro andar de avião.
Manias...
O Deodato acaba de provar que se pode ter beleza bem rentinho ao chão! apanhou desprevenido um belo ângulo do elevador, o sabido! como não sorrir??!!
terá conseguido comprar o passe social?
;)
Legivel, várias observações:
Vertigo do sec XXI, muito inspirado! Bem inspirado.
Provas, nas tuas palavras, que por mais que os nossos temores nos pareçam invencíveis, há sempre alguma coisa maior que se sobrepoe, nem que seja um céu azul.
Há muito tempo que não nos dás notícias da tua-mais-que-tudo, desculpa a
Beijinhos
Ai que até já estou enjoada, essas alturas fazem-me vertigens, é por essas e por outras que vivo em planicie ribatejana.
Boa semana, beijos com carinho.
Isso de ver o azul em pedaços lá ao longe tem mais que se lhe diga!... ;)
O texto está muito bonito, só não sei quem é o deodato.
Beijo
O Deodato deixou, por fim, de ser pequeno. Foi bem a tempo. Vai descobrir muitas coisas. Algumas, de certeza, sobre ele próprio.
Não há nada como subir para percebermos como somos pequenos.
belo momento
Acho que há muito de Deodato em... mim... ia dizer em "muita gente", mas só posso falar por mim...
Vivo nesta cidade há imenso tempo, mas posso garantir que não a conheço como devia, por causa deste mau hábito de me esquecer de olhar para cima (um mau hábito que, neste país, tem justificação, mas essa é oura história)...
e eu acabei de ler um excelente post do mestre Alberto.
Um abração
Gosto muito do que escreves :)
beijos, betty
Oh Legivel, desculpa, o meu comentário ficou cortado, terá sido bloggercensura?
A palavra que falta é: intromissão!
estar sob o céu de Lisboa e não o olhar...é como...
Estás a escrever mais calmamente. A ironia está mais subjacente. nem precisa de vir em pós-texto. Por vezes, parece até que se derrama um leve tom de mágoa.
É lindo, é nosso, viva o Mesnier, e o Eiffel, também e vivas tu, do alto de St Justa!
Caríssimo,
Apesar de andar ausente... são fases... não tenho deixado de te ler. Rompo o meu silêncio para deixar um grande beijinho para o Deodato (que continuará sp a ser o meu eleito), porque vencer o medo das alturas não é nada fácil, bem sei.
É tão difícil vencermos os obstáculos que nos vão aparecendo no dia-a-dia. É tão mais fácil irmos ficando à entrada e à porta, sem nos atrevermos a desafiar as alturas ou quaisquer outras inquietações.
Para concha:
Thanks!
Hoje já é quinta-feira, mas agradeço na mesma...
Para azul:
Isso, ele não me confidenciou; mas... creio que se o Deodato soubesse que há um azul tão luminoso como aquele que ilumina o seu blog...
Um abraço amistoso do seu amigo virtual
Legível.
Para maria papoila:
Estás como eu (excluindo o Deodato da conversa, que agora é mesmo à séria) andar de avião para mim é qualquer coisa de ... libertador.
Coisas...
Para segurademim:
Há aqui uma incorrecção (se assim se lhe pode chamar, que me cumpre clarificar.
Lá que o Deodato tenha receio das alturas, percebo; não será o único. Que naquele dia lhe deu para elevar os olhos ao céu, problema dele.
Mas quem apanhou o belo ângulo do elevador fui eu; não ele. O que é do artista ao artista pertence...
Depois da foto, perdi-o de vista...
Para pé:
É certo que há sempre qualquer coisa que nos torna mais confiantes... diria eu para não exagerar. E que pode ser algo... absolutamente comum aos nossos olhos, aos nossos hábitos. Convivemos com o céu diariamente, não é... ?
No teu blog, dava-te conta que ela ia aparecer num post... lá mais para o verão. Pois imagina que já é a principal intérprete do texto que vou editar a seguir...
beijinhos.
Para lagoa azul:
Pois; tu e os teus pés bem assentes na planície ribatejana.
Mas olha que já tenho visto cada voo de alguns moços de forcados...
Beijinhos amigos e resto de boa semana!
Para sotavento:
Five Points não é assim tão longe como me queres fazer imaginar.
Digo eu, optimista confesso... e adepto de transportes rápidos...
Para @:
Já tenho visto outros azuis, que me agradam tanto como este que habitualmente nos cobre (cruzes canhoto!?).
Sobre paletas de cores, teríamos uma conversa que nunca mais acabava ...
Para manuel:
A fazer o pino?! Não seria a espargata, ao som do homem do saxofone, enquanto duas garinas faziam malabarismos com archotes e um pintor de rua tentava encontrar os traços certos do rosto do jovem escandinavo?
Abraços
Para clotilde:
Obrigado. O Deodato é uma (de entre outras) figura que imaginei para alguns textos antes do Papel de Fantasia. Um dia destes recupero outros.
beijo.
Para rui:
São os melhores pontos de observação; quanto mais alto melhor, para algumas pessoas se interrogarem sobre a sua pequenez.
Sobre "ele" ( o Deodato), não faço conjecturas futuras; limito-me a descrevê-lo enquanto passeante ocasional.
Para marco:
«Obrigado, muito obrigado!» E o artista foi retrocedendo, retrocedendo, até ser engolido pelo pano escuro e enorme do palco virtual...
Para lélé:
É verdade que nos locais onde costumamos passar mais assíduamente, não lhes conhecemos os pormenores em altura.
A maior parte da vezes, tal deve-se a uma questão meramente traumática; olhou-se uma vez e a miséria era tanta que receamos levantar a cabeça outra vez.
Nos paises menos desenvolvidos ou (eufemísticamente) em vias de desenvolvimento, é natural?! passarmos em avenidas de muito comércio, onde as lojas do dito apresentam níveis de apresentação de tal ordem, que os andares imediatamente acima não parecem pertencer ao mesmo imóvel...
Para jpd:
Agradeço a distinção; espero que não seja o sucedâneo?! do Jorge que me condecore...
Abração.
Para folhasdemim
Olá! O teu nome recorda-me algo...
Beijos.
Para pé:
Aqui, que eu saiba, não há censura. Mas vou perguntar ao meu staff. Espera sff.
Já fui; juraram a pés juntos que nenhum usa tesoura ou lápis azul.
Podes ficar descansada. A palavra era intromissão? Ó diabo...
Para pilantra:
Assim que acabar de responder a estes comments e editar o post de hoje dou lá um salto...
Para flor:
E o voo correu bem? Aterraste em segurança? espero que sim...
beijo.
Para seila:
Sob(re) os céus de Lisboa estamos conversados; comungamos da mesma maneira de ver.
Sobre o segundo parágrafo, aconselho-te vivamente a leres o próximo post.
Para manhã:
E vivas tu também, que tens a paxorra de me ler...
Para mulhergorducha:
Caríssima:
Mas temos de as vencer, não é? por vezes até de forma dolorosa -quando não há outra saida... Mas o que hoje nos parece um grande escolho, amanhã, analisado friamente, não passava de um pau de fósforo a entravar o bom funcionamento do nosso quotidiano.
Gosto sempre de te ver por aqui; apesar da tua admiração ir por inteiro para o Deodato. Sou um incompreendido!!!
Beijokas do Deodato.
Pois, Legível... o meu mau hábito não advém de qualquer trauma por um dia ter olhado para cima, mas sim de vários traumas por várias vezes não ter olhado pra baixo e ver onde punha os pés...
Para lélé:
Não me digas que... tropeçaste assim tantas vezes?!... Espero não ter sido nada de grave... em qualquer delas.
Eu ando sempre a cair... nas rasteiras que me pregam; mas sem consequências, que recupero em três tempos...
Os tropeções são relativamente frequentes, mas não me atrapalham muito... até vou mais depressa!... Mas o que, de vez em quando, fica agarrado à sola do sapato...!... Não sei como ainda não se lembraram de fazer uma lei a proibir pisar caca! Com o dinheiro das multas acabavam com o déficit do país...(sim, porque legislar, cá, tem servido essencialmente para arrecadar uns dinheiritos extra com multas)
Para lélé:
Mas como seria isso possível, se cada vez há mais... caca* neste país. Seria um autêntico exercício de equilibrismo, fugir à multa...
* Há também quem lhe chame merda; eu ainda sou mais poético que tu. Prefiro dizer (ou escrever) cocó. Mas qualquer das expressões... tem o mesmo cheiro.
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