SEMPRE A SEGUIR (5)
No dia em que Alípio -que seguia Lídia, que por sua vez seguia Eunice e esta que seguia Jesualdo,decidiu deitar-se sobre o texto anterior (na forma de um relvado propício à meditação) desta história feita de seguimentos, acabou por adormecer. Quando abriu os olhos não queria acreditar no que via: dezenas de pessoas (senão largos milhares) ocupavam agora o espaço verde conversando animadamente e parecendo aguardar que, a todo o momento, algo de extraordinário acontecesse. Congeminou Alípio, que sem saber ler nem escrever, estivesse envolvido num daqueles famigerados piquenicões, com artistas das cantigas , convidados a partir os corações de tão expectante plateia. Mas reconhecendo que as suas congeminações raramente se cruzavam com a realidade, porque não supôr uma situação mais prosaica: que entre tanta gente, alguém o estaria a seguir? Estremeceu à suposição, ele que era um predestinado para seguir alguém mas um zero absoluto quando se sentia seguido. Procurando não se fazer notado, ligou para o autor da história «Você está a arranjar-me um problema dos antigos com o prosseguimento desta cena. Não consegue recriar uma diversão de modo a que me pisgue daqui sem dar nas vistas?» Depois de um curto silêncio, ouviu a voz do autor «Já somos dois com problemas, meu caro! Também eu gostava de saber como é que vou dar continuidade a uma história, da qual já nem recordo o seu início. Fique neste texto mais um pedaço, que hei-de contactá-lo. E não faça nenhum disparate!» Embora contrariado, Alípio acedeu. Manteve-se deitado - agora de rabo voltado para cima - e cobriu a cabeça com um jornal diário que titulava em letras gordas na primeira página "O caso do Best Seller: Caim ilibado, Abel com três jogos de suspensão" e "Jesus revela os milagres da Luz".
Continua... prosseguindo.
2009. Texto e foto de Alberto Oliveira.