Friday, August 31, 2007

A CONSTRUÇÃO
















Cuidadosamente, alisou o pico da torre mais alta do castelo de fantasia que um dia tinha sonhado que havia de construir. Com este gesto, deu por terminada uma obra de reduzido orçamento, sem derrapagens, acabada antes do prazo previsto, envolvendo materiais não poluentes e mão de obra quase a custo zero. Quase, porque o envolvimento no trabalho lhe custou um corneto de morango que naquela altura costumava saborear e uns valentes pontapés numa bola com os primos que o acompanhavam nas idas à praia. Ergueu-se e recuou uns passos para poder ter uma visão mais abrangente do que acabara de produzir. Esfregou das mãos os últimos grãos de areia fina e húmida e vi, nos olhos de menino que nem sete anos teria, um sorriso de satisfação. De repente -quase sem me deixar tomar fôlego para pôr um ponto final nesta história com um final feliz (pelo menos por uma vez, com mil demónios!), apareceu em cena um homem com uma fita métrica na mão e com o aspecto que qualquer fiscal não deve ter para enganar os prevaricadores que, abeirando-se da criança, a questionou com palavras duras e das quais percebi que "... é proibido construir a menos de (?) metros da água -seja ela do mar, do rio, do ribeiro (acho que não falou da água das torneiras das banheiras das casas de banho... ) e que por tal, o castelo de fantasia tem de ser imediatamente demolido." A expressão que vi na cara do garoto não deixava margem para dúvidas: estava ali um futuro autarca em potência.
Quarteira, 2007. Texto e foto de Alberto Oliveira.