O INSÓLITO ACONTECIMENTO
Prenunciava-se o final de uma tarde de domingo de Maio, sem a presença de sol e com um vento fresco que aconselhava o agasalho aos mais idosos ou friorentos, quando o caminhar de viajante inveterado de lugares e da gente que os preenche, me conduziu até àquela praça. O que me chamou desde logo a atenção, foi o número apreciável de pessoas que ali se encontravam, quer sentadas quer de pé, mas todas elas com os olhares centrados para a esquerda dum ponto que a imagem não mostra. Não perdi tempo a questionar quem ali estava mais à mão de semear, no caso, o homem de fato claro, sentado, à direita baixa da foto e que segurava um saco de plástico com ambas as mãos. "Espectáculo de dançares folclóricos?, comício eleitoral?, teatro urbano? ou o anunciar de uma nova fé?" inquiri de um fôlego. "... é que daqui não consigo distinguir o que se passa." Olhou-me sem surpresa ou desagrado e respondeu "Como é que consegue ver o que está a acontecer, se está desse lado da fotografia? Chegue-se lá aqui para o pé de mim. Vá lá!... mais um pouco que eu não mordo. E agora diga-me lá, se já não observa distintamente o que antes não conseguia descortinar?" Tinha razão o homem. Do lado esquerdo da foto vi -em perfeitas condições, o modem do meu computador, uma moldura com os meus seis filhos (alinhados em escadinha por alturas e escanzeladíssimos) numa ida à praia de Monte Gordo, dois pequenos peluches-porta-chaves, sendo um deles um leão de calções azuis?! e o outro um elefante-a-fingir-de-porquinho que me foi oferecido por uma artista de cinema espanhola, quando fiz a bonita idade de trinta anos, um dicionário português-português por causa das tosses e uma peúga-amuleto, branca?!, usada e com um buraco no calcanhar.
Burgos, 2006. Texto e foto de Alberto Oliveira.
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